Como a linguagem corporal revela emoções ocultas
Por António Sacavém
A publicação do livro «Body Language», de Julius Fast, em 1970, marcou a maneira como passámos a designar uma forma ancestral, silenciosa e poderosa de comunicar: a linguagem corporal. Aqui integramos todos os comportamentos que ocorrem durante o processo de comunicação e que não incluem a utilização de palavras, nomeadamente as expressões faciais da emoção, o contacto físico, os gestos, as posturas e a utilização da voz (tom, timbre, volume).
A linguagem corporal representa, na generalidade, mais de 60% do processo de comunicação. Por isso, é tão importante estarmos conscientes do que dizemos como daquilo que o nosso corpo manifesta. Na verdade, a grande maioria das pessoas está muito mais consciente das palavras que utiliza do que dos gestos que manifesta. É indispensável, no entanto, que nos sintonizemos mais com as mensagens que transmitimos com o corpo, se queremos comunicar congruência, autenticidade, credibilidade e confiança.
Neurocientistas da Colgate University chegaram à conclusão de que, quando aquilo que dizemos não está em sintonia com aquilo que o nosso corpo comunica, a mensagem tem tendência para se perder.
Por isso, é fundamental que enquanto líderes, professores, negociadores, comerciais, profissionais de recursos humanos, profissionais de saúde, profissionais de segurança, jornalistas, etc, estejamos mais conscientes dos sinais corporais que emitimos, de forma a passarmos a comunicar com as nossas equipas, os alunos, os clientes, os parceiros e o público em geral, de forma mais sólida, genuína e eficaz. Saber escutar atentamente é importante, observar ativamente é indispensável.
Conseguirmos observar, contextualizar e descodificar adequadamente esta «dimensão silenciosa» do processo de comunicação pode dar-nos informação preciosa e garantir a construção de relações mais saudáveis e autênticas. Permite-nos começar a perceber o que os outros pensam, sentem e as suas reais intenções, para além das suas palavras.
Vejamos… Quando sentimos entusiasmo e confiança, o sistema límbico (responsável pela regulação emocional) manifesta essas emoções, em especial através da linguagem corporal. Quando alguém acaba de receber uma boa notícia, por muito que as suas palavras sejam contidas, pode revelar a sua alegria através de comportamentos que «desafiam a força da gravidade», como:
– polegares levantados;
– braços esticados acima da cabeça;
– ou calcanhar no chão e ponta do pé levantada.
A linguagem corporal mostra-nos também quando alguém está nervoso. Uma pessoa ansiosa numa reunião, se sente necessidade de se acalmar pode manifestar aquilo que designamos por comportamentos «pacificadores» ou «adaptadores», como:
– esfregar as pernas com as mãos;
– ventilar a gola da camisa;
– coçar a cabeça;
– ou balancear a caneta na boca.
Nas reuniões é habitual ver alguns dos intervenientes a esfregarem, rodarem e até a morderem uma caneta.
Estes comportamentos têm como principal objetivo ajudar a reduzir o nível de stress.
A face humana também nos dá informação muito útil para descodificar as emoções ocultas que as pessoas estão a sentir. As micro-expressões faciais – contrações rápidas e involuntárias dos músculos da face – são estudadas pela ciência há mais de 50 anos e têm sido objeto de crescente interesse, em virtude do aparecimento de séries televisivas como a «Lie to Me», da Fox. A alegria, o desprezo, o nojo, o medo, a tristeza, a raiva e a surpresa são as sete micro-expressões
universais.
Por exemplo, se no decorrer de uma negociação digo ao meu interlocutor que «consta no mercado que a sua margem liquida é de 17%» e nesse momento observo uma micro-expressão de desprezo ou de alegria, é provável que eu esteja mal informado.
No entanto, se ele reage com raiva ou nojo, já é possível que a minha informação esteja próxima da verdade.
Um estudo da Wharton School indica que 100% dos negociadores ocultaram um problema ou mentiram ativamente acerca do mesmo. Quando os negociadores integrarem este saber, que exige conhecimento e treino, passarão a detetar incongruências na comunicação com mais facilidade e terão melhores resultados.
Não basta, porém, descodificar as micro-expressões.
E fundamental sabermos responder, com eficácia, aos sinais não verbais. Por isso, o Center for Body Language, organização internacional de referência nesta área, desenvolveu duas técnicas importantes: a «BLINK Conversation Technique» e a «Effective Conversations».
Conseguirmos «ler» os estados emocionais das pessoas com as quais estamos a comunicar é uma competência notável que podemos utilizar nas esferas profissional e pessoal. Dá-nos pistas para distinguirmos a verdade da mentira e de potenciais intenções maliciosas. Mas também nos ajuda a criar relações mais sólidas e genuínas.
O ser humano tem uma capacidade de apenas 54% para detetar a mentira. Através de formação adequada, as pessoas poderão aumentar a sua capacidade para detetar as micro-expressões em mais de 30%.
O treino, contudo, deve ser desenvolvido tendo por base a utilização de um bom simulador de micro-expressões, baseado em vídeos, dado que a aquisição de competências se desenvolve de forma mais real e com um nível elevado de eficácia.
Estas competências também são muito úteis ao nível do coaching e do mentoring, pois permitem:
– perceber mais facilmente as emoções que os clientes estão a sentir;
– construir uma confiança instantânea;
– uma relação de forma mais profunda e transformacional
com os clientes;
– e detetar incongruências entre a linguagem verbal e a não verbal e potenciais oportunidades de alinhamento interno.
Quando aprofundamos os nossos conhecimentos de linguagem corporal, não só ficamos mais conscientes dos sinais não verbais que emitimos como passamos a comunicar de forma mais impactante e autêntica.
Conseguimos ainda distinguir melhor a verdade da mentira e, desta forma, criar uma confiança sólida na nossa equipa e junto daqueles que nos rodeiam.