Por: Pedro Celeste
Existe um modelo óptimo para a remuneração da força de vendas? Sabemos que não, porque se assim fosse as empresas utilizavam-no como exemplo aplicável a qualquer caso. Todavia, é possível enquadrar uma forma de remuneração da força de vendas a partir de um modelo, este sim, aplicável à generalidade dos negócios. Este modelo tem origem, precisamente, nos factores que contribuem para o insucesso da venda.
Afinal, porque falham os vendedores? Se colocarmos esta questão às chefias de vendas, obtemos, entre outras, as seguintes respostas:
- Falta de planeamento e organização
- Incapacidade de tomar a iniciativa
- Escassa focalização no cliente
- Inexistência de objectivos pessoais a médio prazo
No entanto, se a mesma questão for colocada aos próprios vendedores, a argumentação conhece outros contornos:
- Dificuldades de comunicação
- Insuficiente formação técnica e comportamental
- Incapacidade para perceber as necessidades dos clientes
- Não percepção das prioridades na gestão de clientes
- Fraca ligação do marketing com a realidade
Na verdade, ambas as visões do insucesso da venda podem ser minimizadas através da formação ou realocação de recursos. É neste sentido que se torna importante identificar com clareza os factores que podem influenciar o comportamento dos vendedores e o seu impacto na respectiva performance. Merecem particular destaque os seguintes:
- Grau de percepção do negócio, que por sua vez pode ser constituído por três tipos de problemas:
- Conflito, quando um cliente sugere um compromisso inaceitável para o vendedor (ex: prazo de entrega, preço);
- Ambiguidade, quando o vendedor não está de posse de toda a informação, como seja a possibilidade de negociar um preço abaixo de determinado nível;
- Incúria, quando o vendedor julga que determinada variável é negociável, quando não o é.
- Aptidão, que corresponde a um conjunto de características pessoais que compõem o perfil do vendedor, tais como a personalidade, capacidade de persuasão, inteligência, comunicação, etc…
- Conhecimentos Técnicos, que se circunscrevem ao produto, às técnicas de venda, de apresentação, comunicação, identificação de oportunidades de negócio, etc…
- Meio Envolvente, caracterizado pela intensidade da procura, agressividade dos concorrentes, nível do esforço de marketing, etc…
- Motivação, que pode ser medida em função da intensidade que cada vendedor dedica às diversas tarefas que constituem a sua função, designadamente, abertura de novas contas, demonstrações e apresentações, elaboração de relatórios, pesquisa na identificação de oportunidades de negócio, etc.
Neste contexto, podemos partir do seguinte esquema motivacional, independentemente da dimensão da empresa ou sector de actividade e onde tudo tem origem na motivação.

Desenvolver um esquema consistente e sustentado encorajará o esforço pessoal no atingimento de objectivos através da validação de alguns parâmetros, tais como a qualidade e fiabilidade do produto ou serviço, imagem e reputação da marca, apoio logístico, inovação, formação, campanhas de marketing, etc…
É sabido que os vendedores têm tendência para argumentar o insucesso com a falta de informação ou suportes de comunicação dos produtos/serviços e pelo facto dos concorrentes praticarem preços mais baixos, para além das deficiências que normalmente encontram nas áreas de customer service e apoio logístico.
O nível de recompensa, independentemente da sua forma de cálculo, premeia os resultados alcançados, ou seja, a performance obtida com o trabalho desenvolvido, medida em volume de negócios, margens médias, rentabilidade global, capacidade de colocar novos produtos no mercado, etc.. O nível da recompensa é consubstanciado em mais dinheiro recebido, promoção na função para melhores territórios ou contas, promoção para outras funções, etc… É da responsabilidade da chefia de vendas gerir e comunicar as várias escalas de performance desejada e a respectiva recompensa, de uma forma clara e objectiva, evitando assim a falta de credibilidade do modelo aplicado. A percepção de que a recompensa aumenta com a melhoria da performance indicia que a satisfação aumentará pelo menos na mesma proporção. Por outro lado, todos os vendedores saberão avaliar no imediato a relação performance/recompensa, isto é, a justeza da avaliação do seu desempenho.
Seria bom recordar que todos os outros colaboradores da empresa fazem o mesmo raciocínio, ou seja, a recompensa representa um prémio que não se deve circunscrever à força de vendas, como acontece na maioria das organizações tradicionais. Trata-se de um convite explícito à fraca performance, medida por exemplo em termos de eficiência e produtividade.
Sendo assim, como valorizar a performance? Se a recompensa é uma componente essencial do processo de motivação da força de vendas, é importante saber como se deve classificar e medir a performance. O output da performance dos vendedores pode ser medido em termos quantitativos e qualitativos e é desejável que a avaliação global contemple as duas formas.
No tocante aos parâmetros quantitativos (volume de negócios, contribuição para os resultados, número de encomendas, número de novos clientes, etc…) devemos ter em conta que eles são função de um conjunto alargado de inputs, como por exemplo o número de telefonemas ou visitas aos clientes, tempo dedicado ao contacto com o cliente versus organização e planeamento da venda, entre outros. Sugere-se então um indicador que contemple as diferentes etapas de um processo de venda e que permita aferir, passo a passo, a performance do vendedor, numa lógica de input/output.
Imaginemos, por isso, o processo mais comum do ciclo de venda que contempla as fases constantes da seguinte figura.
Por exemplo, na passagem dos Telefonemas para as Visitas, através do rácio Visitas/Telefonemas, o principal parâmetro a medir é o da eficácia da acção do ponto de vista do contacto telefónico. Factores como a persuasão ou a credibilidade na forma de contacto podem ser avaliados nesta fase. Já na passagem da etapa das Visitas para as Propostas se avalia a capacidade do vendedor em interpretar as necessidades dos seus clientes, a par da capacidade negocial em levar por diante a gestão da conta.
A rapidez da apresentação da proposta, bem como a sua clareza e objectividade podem ser medidas na passagem das propostas para as vendas. Nesta etapa também é possível aferir da competitividade do produto face às demais alternativas, bem como da capacidade de fecho de venda por parte do vendedor.
A última etapa deste ciclo é todavia a mais importante e raramente é medida em termo de impacto na performance dos vendedores. Refiro-me ao grau de satisfação dos clientes. Os vendedores são, por norma, premiados em função do “momento”, isto é, quando vendem, mas não em função do grau de satisfação provocado nos seus clientes, que é medido à posteriori. No entanto parece razoável premiar um vendedor pelo facto de manter um cliente satisfeito ao longo do tempo. (Apenas o vendedor ou toda a equipa que contribuiu para a recompra, como é o caso da assistência técnica? Por exemplo, no ramo automóvel, cujo ciclo de compra médio é de cerca de 4 anos, o vendedor apenas aparece nos momentos da venda, enquanto que os serviços de assistência técnica tiveram diversos contactos com os clientes. Pergunta-se: neste caso, e na hipótese de um bom serviço prestado e a consequente fidelização de um cliente satisfeito, de quem é o mérito? E quem é premiado na recompra?)

Numa perspectiva global e com base no ciclo de venda enunciado, podemos avaliar a performance dos vendedores pelo cruzamento dos seguintes parâmetros:

Faltam, contudo, os métodos qualitativos que concentram grande parte de desempenho do vendedor, balizam as suas capacidades e limitações e, através da leitura dos indicadores, permitem um melhor aproveitamento das potencialidades individuais. Devem consistir em indicadores que permitam obter a qualidade do trabalho desenvolvido, designadamente a produtividade e rentabilidade e podem ser combinados com os métodos quantitativos numa perspectiva de ranking.
Tomemos o seguinte exemplo para ilustrar a combinação dos parâmetros quantitativos:

A ilação que se retira de cada parâmetro pode indiciar algumas qualidades e deficiências de cada vendedor e contribui para optimizar o plano de acção de vendas futuro, nomeadamente no que respeita ao tempo de dedicação a cada tarefa e às respectivas necessidades de formação.
Este modelo encoraja a competição interna, reconhece objectivamente a performance de cada vendedor e desincentiva uma gestão ineficiente do tempo dedicado à venda. Tem a vantagem de também poder aplicado a grupos de vendedores, podendo premiar a equipa no seu todo.
Como remunerar os vendedores? Um dos principais problemas que se coloca à chefia de vendas é o de saber que modelo de remuneração deve ser implementado. Que componente fixa e variável? Que componente financeira e não-financeira?
Em todo o raciocínio anterior defendeu-se que o principal objectivo do trabalho do vendedor é abrir mercado, fidelizá-lo e gerir clientes satisfeitos. Também se disse que a satisfação dos clientes está directamente ligada à satisfação interna, isto é, à motivação dos vendedores. Se assim é, então o modelo de remuneração deve ter em atenção a particularidade de cada vendedor, ou seja, a forma que mais contribui para o incremento da sua motivação pessoal. Na realidade, há estudos que provam que uma parte significativa dos vendedores não aprova a sua componente retributiva. Uma das formas mais simples, directa e que supera com eficácia este problema é o de confrontar o vendedor com as suas ambições e objectivos (o princípio é válido para todos os restantes colaboradores da empresa). A maior proximidade entre o atingimento dos objectivos e a recompensa individual tem provado ser o sistema mais eficaz de remunerações, que aumenta, por outro lado, a motivação e empenhamento dos vendedores.
A compensação retributiva deve, pois, assentar no cumprimento de objectivos, visando premiar o desempenho individual e os resultados alcançados em projectos grupais, de forma a constituir um package atractivo de recompensas, aumentar a motivação individual e fomentar a importância do trabalho de equipa.
O principal objectivo é o de que a remuneração variável represente, mediante o atingimento global dos objectivos, entre 2 a 4 vezes a remuneração fixa, dependendo da performance alcançada.
Não há modelos óptimos de remuneração da força de vendas. Existem sim formas de melhor compreender as motivações dos vendedores. Partindo dessas premissas cabe à chefia de vendas criar uma bateria de indicadores quantitativos e qualitativos que meçam objectivamente a performance de cada vendedor. As recompensas assentes num ciclo de venda global, apoiadas num ranking de desempenho constituem a matriz do processo. O princípio do raciocínio apoia-se na motivação dos vendedores e o fim do processo sustenta-se com a satisfação dos clientes.
Ou como se costuma dizer “tudo está bem, quando acaba bem”.