Por: Rui Guedes – Páginas Amarelas
A globalização reduziu alguma da magia existente na descoberta, já que passámos a saber quase tudo por antecipação, relativamente a um qualquer local a que uma viagem nos leve. Antes de partirmos já vimos fotos do hotel e dos locais a visitar e quando chegamos ao destino nem sequer damos relevo ao facto de vermos aquela bebida ou aquela loja.
Ouvia recentemente o jornalista e historiador Germano Silva dizer que nas suas caminhadas diárias descobria constantemente coisas novas. Talvez esteja aqui um dos elixires da juventude: a capacidade de se deixar deslumbrar pelas pequenas coisas e a disponibilidade para absorver o muito que a realidade tem para nos oferecer.
Nem todos terão o talento de ver o simples para além do óbvio, mas também é certo que em muitos casos os cenários são de tal forma impactantes, que difícil seria não ver. Uma das coisas que imediatamente retive numa primeira incursão pelo território de Macau, foi um conjunto de enormes prédios em construção, envolvidos por um emaranhado pouco fácil de descodificar. A curiosidade levou a que me fosse aproximando. Percebi então que se tratava de andaimes, feitos com tubos de bambu.
Explorando um pouco mais o assunto, soube que se tratava de uma técnica milenar chinesa, que continuava suportada na evidência de estarmos perante um material leve, flexível, durável, adaptável, fácil de movimentar, amigo do ambiente, resistente e especialmente recomendado em zonas mais propensas à ocorrência de sismos. Estando em causa uma estrutura altamente resiliente, interessa referir que o bambu é das plantas com maior rapidez de crescimento no mundo e as suas conexões são múltiplas, mas muito simples, já que dispensam a utilização de parafusos, abraçadeiras, etc.
Estas técnicas ancestrais parecem estar nos antípodas de uma transformação digital que corre vertiginosa e se tem evidenciado através de um conjunto de processos que, com recurso à tecnologia, alteram radicalmente a forma de se fazerem negócios, envolvendo mudanças que tocam em todos os aspetos de uma organização. Os diferentes profissionais confrontados com a exigência de adquirir novas competências técnicas, veem no upskilling ou no reskilling formas de não perder esta corrida, já que o tiro de partida há muito foi dado e esta é, portanto, uma viagem sem retorno.
Peter Drucker terá dito que as pessoas eram contratadas pelas suas habilidades técnicas, mas eram demitidas pelos seus comportamentos. Ora este é um ponto fulcral já que, com formação académica e treino se pode ir ficando um especialista, mas é necessário perceber que as soft skills já estão na primeira linha das exigências.
Sem desvalorizar as competências que definem um comercial desta nova e aliciante era, deter-me-ia numa frase de Belmiro de Azevedo que poderia ser a síntese de uma formação em vendas: “O fundamental é ter, permanentemente, a cabeça aberta, ser curioso, ouvir, fazer perguntas inteligentes, partir sempre da hipótese de que tudo se pode fazer“.
Esta citação por si só, é como que uma bíblia, mas temos de ir mais além, já que agora é evidente que um grande Consultor Comercial terá que ser leve, flexível e adaptável. Terá que ser capaz de se movimentar facilmente, ser resistente e estabelecer múltiplas conexões. Sim, com efeito, são os atributos dos andaimes de bambu, a tal sapiência milenar do oriente. Como se tudo isto já não fosse suficientemente claro, recordo a resiliência da estrutura e o seu uso em zonas sísmicas num paralelismo nítido com a instabilidade dos atuais mercados.
O bambu é amigo do ambiente, na esteira de um caminho que estamos obrigados a percorrer, e ainda consegue alertar-nos para a necessidade de uma rapidez no crescimento profissional rumo a uma carreira durável, suportada na capacidade de entregar resultados consistentes, sabendo que em cada mês há sempre um novo objetivo a ser superado.
Os desafios profissionais que enfrentamos em alturas de grande volatilidade arrastam consigo enormes oportunidades e arrancam do mais profundo de cada um de nós, muito do melhor que temos para dar. Trazendo para o nosso quotidiano o já citado emaranhado, mas agora explicitamente descodificado, ficamos mais preparados para acelerar este processo de transformação, mas com a pulsação a 60 bpm e um sorriso rasgado no rosto.
A Transformação Digital deixou de ser uma opção, pois está aí e vai continuar a agigantar-se em sismos sucessivos, independentemente das vontades individuais. Quanto à Transformação Pessoal, tudo é diferente pois cabe a cada um decidir se quer impedir que um sismo ocorra, ou se está disposto a oscilar tranquilamente réplica após réplica, sem deixar de colocar mais um tijolo no prédio que está a construir.