Construir para concretizar
Por José António Rousseau
Um dos temas musicais que mais me impressionou e marcou o ouvido, a mente e o coração foi o fantástico «Operário em Construção», do Chico Buarque de Holanda. Aquele crescendo musical similar ao «Bolero», de Ravel, a malha, repetida, sempre das mesmas palavras, enredadas umas nas outras, numa infinita multiplicidade de sentidos, a força daquele jogo de espelhos de imagens e das subliminares mensagens que entravam por mim a dentro sem pedir licença, tornavam esta peça um momento musical singular.
Mas toda e qualquer construção, as ações que desenvolvemos para erguer algo, são isto mesmo: momentos únicos. Por vezes, até irrepetíveis.
Contudo, lamentavelmente, Construir é um verbo que quase sempre se conjuga apenas na primeira pessoa do singular ou do plural e logo desta forma bizarra: eu construo, tu destróis, ele destrói; nós construímos, vós destruís, eles destroem. E quase se poderia conjugar da mesma forma o verbo Concretizar: Eu concretizo, tu apenas começas, ele deixa a meio, nós concretizamos, vocês desculpam-se e desistem, eles nem sequer começam.
Na verdade, muitos são ainda os que se preocupam mais em destruir do que em construir e são ainda mais os que apenas começam e não conseguem concretizar nada. Se é tão fácil destruir, por quê construir?
Se é tão fácil desistir, por quê insistir? Por quê construir e desenvolver relações? Por quê construir e concretizar projetos? Por quê construir um percurso e concretizar uma história de vida?
Porque viver é isso mesmo: CONSTRUIR e CONCRETIZAR. Qualquer um de nós é, e será sempre, uma pessoa em construção. E viver sem construir e sem nada concretizar não é uma existência, é uma expiação.
Os empresários e os profissionais de qualquer atividade são verdadeiros construtores de valor, de riqueza, concretizando ideias e projetos como verdadeiros criadores, porque criar algo de novo é construir com a imaginação, numa constante disputa entre o talento e o génio. Como dizia Schoppenhauer, se ter talento é conseguir atingir um alvo que os outros não conseguem atingir, ter génio é atingir um alvo que os outros nem sequer conseguem ver. De facto, digo também eu, se inovar é construir a partir de algo já existente, inventar é concretizar algo a partir do nada.
Mas aprender também é construir. É construirmo-nos por dentro para conseguirmos concretizar os nossos sonhos. E ensinar é construir por fora e concretizar nas pessoas dos outros. Ler é construir ideias mas escrever é concretizar edifícios de pensamentos com o cimento das palavras. E dialogar é criar condições para concretizar entendimentos, consensos e soluções para os problemas e para as dificuldades sem fim que persistem em nos querer complicar a existência. Mas sempre, sempre sem desistir.

