O conceito de Human Augmentation – que pode ser definido como o processo de aperfeiçoamento/melhoria das habilidades humanas (físicas e mentais) através da tecnologia – estava, até há pouco tempo, reservado ao palco da ficção científica. Contudo, à medida que a digitalização se tem tornado uma realidade dos nossos dias, transversal a inúmeros setores, também este tema tem ganho um novo fôlego.
Um estudo recente da Kaspersky, que inquiriu 14.500 pessoas em 16 países – incluindo a Europa e o Norte de África – revela um entusiamo generalizado pela tecnologia do Human Augmentation. Esta mesma investigação concluiu que os portugueses – à semelhança dos inquiridos noutros países – não estão cem por cento satisfeitos consigo próprios, pois só 4% afirmaram que não melhorariam nenhum aspeto no seu corpo. Por outro lado, 75% dos portugueses mostraram-se recetivos em melhorar as suas capacidades físicas e mentais recorrendo a implantes tecnológicos no seu organismo, temporária ou permanentemente.
Da amostra global, verifica-se que os italianos são a população mais interessada no Human Augmentation (81%), enquanto os britânicos são a nacionalidade mais cética relativamente a esta tecnologia (33%).
Além disso, 6 em cada 10 portugueses acredita que o Human Augmentation será usado para o bem da sociedade e quase dois terços (64%) crê no seu impacto positivo para melhorar a qualidade de vida, defendendo ainda que o ser humano deve ter liberdade de alterar o seu corpo conforme desejar (41%).
Apesar desta perceção positiva, persistem algumas dúvidas. Por exemplo, os portugueses que participaram no inquérito temem que o Human Augmentation seja um avanço tecnológico ao alcance apenas das pessoas com elevadas posses monetárias (45%), 26% receia que possam dar-se complicações técnicas ao nível do funcionamento dos elementos tecnológicos implantados, enquanto para 20% dos portugueses o principal medo é que os seus corpos possam ser hackeados por cibercriminosos.
Para Marco Preuss, diretor europeu da GReAT (Equipa de Investigação e Análise Global da Kaspersky), “o Human Augmentation é uma das principais e mais importantes tendências tecnológicas hoje em dia”. E acrescenta: “Estamos a assistir a uma ampla gama de aplicações práticas desta tecnologia, nomeadamente nas áreas da saúde, serviços sociais, desporto, educação ou transportes. Os exoesqueletos para bombeiros e outros profissionais de resgate ou o bioprinting de órgãos são alguns exemplos. Contudo, não podemos esquecer – como em tudo o que envolve tecnologia – são necessários padrões de segurança comuns para garantir que se tira todo o potencial do Human Augmentation, minimizando ao máximo os riscos”.
Estas são as principais conclusões globais da investigação conduzida pela Kaspersky:
- Os inquiridos do sul da Europa, incluindo Espanha, Portugal, Grécia e Itália, assim como Marrocos, são os mais recetivos ao Human Augmentation.
 
- Os britânicos e os franceses parecem ser os mais céticos. De facto, 36% e 30% destes inquiridos, respetivamente, mostraram-se contra esta tendência tecnológica. Mais de metade dos participantes em França (53%) e no Reino Unido (52%) acredita que o Human Augmentation poderá ser perigoso para a sociedade, um resultado muito acima da média global do estudo, que se fixa em 39%.
 
- A tecnologia de aperfeiçoamento do corpo humano usada para alcançar um físico mais atrativo interessa a mais de um terço das mulheres (36%) e a um quarto dos homens (25%), sendo que estes preferem mais melhorar a sua força (23%) do que o sexo feminino (18%).
 
- Quase metade dos inquiridos (47%) considera que as entidades governamentais deveriam regular a tecnologia do Human Augmentation. O Reino Unido é o país mais a favor da intervenção do Governo neste tema (77%) e a Grécia aquele que se apresenta mais em oposição (17%). Sobre este ponto, 56% dos portugueses concorda com a intervenção governamental.
 
A Kaspersky apresentou as conclusões desta investigação numa mesa redonda “virtual”, moderada pela jornalista de tecnologia Kate Russell, na qual o tema do Human Augmentation esteve em debate. Participaram neste evento, que se realizou ontem (dia 16):
- Zoltan Istvan, escritor e fundador do Partido Transhumanista;
 - Julian Savulescu, Professor na Universidade de Oxford e diretor da Cátedra Uehiro de Ética Prática;
 - David Jacoby, Investigador Sénior de Segurança da GReAT de Kaspersky;
 - Marco Preuss, Diretor Europeu da GReAT de Kaspersky;
 
Na opinião de Zoltan Istvan, “a maioria das pessoas parece estar a favor do Human Augmentation, desde que se vejam benefícios económicos e médicos do uso desta tecnologia”. “Historicamente, a sociedade rejeita ao início as inovações tecnológicas, mas acaba mais tarde por aceitá-las quando se dá conta que os seus empregos e a segurança do seu país também está em jogo”, acrescenta.
Já para o professor de ética, Julian Savulescu, “a maior ameaça que enfrentamos é a desigualdade humana, sendo que o aperfeiçoamento humano tem potencial para agravar as desigualdades existentes. Daí que o grande desafio para as entidades governamentais em todo o mundo irá ser o de como aproveitar o Human Augmentation para fazer o bem”.
Por fim, o especialista da Kaspersky, David Jacoby, conclui: “Ao longo da história, os cibercriminosos exploraram sempre as novas tecnologias e com o Human Augmentation não será certamente diferente, embora estes avanços tenham sido geralmente positivos para a Humanidade. Posto isto, devemos permanecer vigilantes face às tentativas de utilização mal-intencionada desta tecnologia ou de ataques de segurança, quando o Human Augmentation se tornar uma realidade quotidiana”.
Sobre o relatório da Kaspersky
O trabalho de campo foi realizado pela Opinium Research entre 9 e 27 de julho de 2020, contando com a participação de 14.500 inquiridos com mais de 18 anos, em 16 países: Alemanha, Áustria, Bélgica, Dinamarca, Espanha, França, Grécia, Hungria, Itália, Marrocos, Países Baixos, Portugal, Reino Unido, República Checa, România e Suíça.


