Vendedores rebeldes vendem melhor!
Francesca Gino
DO it!: Os negociadores são Profissionais que enfrentam a necessidade de tomar decisões em situações de stress. O que recomenda para a criação de um estado mental que favoreça a melhor decisão possível em situações de tensão?
FG: A ciência mostra-nos que se abordarmos as situações de desempenho de alto risco, geralmente bastante stressantes, convencendo-nos a nós próprios de que estamos empolgados (em vez de simplesmente dizermos a nós próprios que temos que nos acalmar), essa estratégia nos deixa menos ansiosos e melhorará o nosso desempenho. Se temermos uma próxima negociação ou uma situação stressante no trabalho, poderemos enquadrá-la como uma oportunidade de aprender e melhorar, em vez de nos focarmos na nossa ansiedade. Como referi no livro “Talento Rebelde”, os rebeldes sabem esperar o máximo de todos, incluindo eles mesmos.
DO it!: A atividade de um comercial pode ser em boa parte solitária, podendo levar a várias interpretações da realidade. Como assegurar que esses profissionais cultivam um espírito rebelde que favorece o seu sucesso profissional alinhado com os objetivos da Organização?
FG: Em todos os tipos de organizações que visitei e estudei que realmente incentivavam a rebeldia, notei que os líderes eram 100% claros e transparentes em duas questões: os Valores da Organização e o compromisso de todos nela para com eles, a par das regras que não devem ser quebradas. Dessa forma, os rebeldes têm controlo sobre o seu trabalho, mas dentro dos limites pré-estabelecidos. Assegurar que, tal como outros colaboradores, também eles estão comprometidos com os mesmos Valores, é importante. A partir daí eles devem poder escolher e usufruir de flexibilidade para viverem por eles e decidirem sobre a forma de fazerem o seu trabalho.
DO it!: No seu livro, refere que o improviso pode encorajar a empatia com os outros, uma dimensão essencial nas relações negociais. Como se desenvolve a capacidade de improvisar?
FG: Há alguns anos atrás, no Natal, decidi oferecer ao meu marido um presente fora do vulgar: um curso de comédia de improvisação de 10 semanas, que ambos frequentaríamos. Greg não é um tipo de pessoa de improviso, nem eu. Ele é um fanático por tecnologia, e preferiria muito mais desmantelar um computador antigo, programar ou entreter-se com um novo gadget para tentar fazer alguém desconhecido rir. Imagine só a cara dele e a expressão dele depois de desembrulhar a caixa grande que encontrou debaixo da árvore de Natal: “Este é o meu presente?”
Mas eu pensei que improvisação seria uma maneira divertida de nos unirmos como casal, enquanto combinávamos aventura com explosões de riso, às vezes às nossas próprias custas.
Eu tinha certeza de que o Greg iria mudar de ideia assim que aparecêssemos na primeira aula. Eu estava errada. Durante toda a sessão, ele não só parecia desconfortável, mas até infeliz. “Eu odeio isto”, disse-me enquanto nos dirigíamos para casa.
Mas pouco depois algo de engraçado aconteceu, e de várias formas. O Greg começou a gostar de improvisar. Sessão após sessão, envolvemo-nos em vários tipos de atividades, desde a narrativa colaborativa até a construção de cenas no momento. A falta de jeito que sentimos ao princípio deu lugar à confiança de que, independentemente do exercício que nos pedissem, o riso (e a autodescoberta) fariam parte da experiência.
Todos nós caímos em rotinas previsíveis. Elas dão estabilidade aos nossos horários e dão ritmo à vida. Mas ao confiarmos demasiado nelas, perdemos oportunidades de nos desafiar e de nos surpreendermos a nós mesmos. Quando nos afundamos na rotina, a complacência e o tédio seguem-se. Podemos trazer mais alegria e emoção aos nossos dias e fortalecer os nossos relacionamentos, quando procuramos o romance. Ao tentarmos coisas novas, desafiando-nos e se indo além da nossa zona de conforto, melhoramos as nossas vidas.
Existe uma maneira simples de começar a desenvolver a capacidade de improvisar e de apreciar o novo: pense em quantas mudanças cada um de nós pode fazer na sua rotina. Também nos devemos continuar a questionar: “E que tal se eu…”
DO it!: Fazer perguntas é uma ferramenta fundamental em interações comerciais. Que características deve ter uma dinâmica de questionamento para conseguir o maior impacto positivo no outro?
FG: Deve partir-se de um ponto de aceitação do outro, e de uma atitude de curiosidade genuína. Julgar é fácil e muitas vezes é negativo. Nós descartamos as ideias dos outros em vez de construirmos a partir delas. Mas fazemos melhor e aprendemos mais sobre o mundo quando incorporamos outras visões.
Todas as vezes que se está prestes a dizer “Não” ou “Mas”, em vez disso, deve-se oferecer um “Sim” aberto e… adicionar o seu próprio pensamento. Isso é um “desafio” e uma regra que a gigante da animação Pixar segue em reuniões de brainstorming. Então, ao longo do dia, elimine o julgamento.
E mais, sempre que puder, comprometa-se a dar aos outros o benefício da dúvida. Um motorista não parou quando você estava a tentar atravessar a rua? Talvez ele não fosse um idiota, mas simplesmente não o tenha visto a si. Alguém no trabalho sugere uma abordagem diferente para uma tarefa em que você está a trabalhar? Não fique na defensiva. Sempre que sentir o desejo de julgar, mude a sua mentalidade para melhorar a ideia, em vez de a rejeitar.
DO it!: O livro enfatiza que perdemos a capacidade de nos surpreendermos quando apenas seguimos regras e ordens na execução do nosso trabalho. Que capacidades humanas deve um negociador cultivar para poder surpreender positivamente os seus interlocutores?
FG: Quando somos crianças, somos todos exploradores, mas essa qualidade diminui à medida que a idade e a responsabilidade nos focam em fazer as coisas acontecerem. Um negociador deve cultivar a capacidade de ser e de permanecer curioso – sobre os outros, os seus interesses, as suas necessidades. A curiosidade pode ser desencadeada perguntando-se “porquê?”.
Ao longo do dia, pergunte a si mesmo “E se?” e “Como poderíamos…?” As crianças fazem essas perguntas constantemente. Por que pagamos pelas coisas? Por que não posso simplesmente sair sem roupa? Por que é que os coelhos fogem quando eu os persigo? Por que há um arco-íris depois de uma tempestade?
Reviver esses sentimentos, ser mais curioso e explorar é importante: aumenta nossa curiosidade. Trate todos os momentos de interação com a pessoa com quem está a negociar como uma oportunidade de aprender sobre os interesses dela.
DO it!: “A falta de franqueza leva a ambientes disfuncionais”. Que aspetos devemos ter em mente para nutrir e estimular a sinceridade?
FG: Devemos lembrar-nos da importância do respeito. Quando Christine Porath, da Georgetown University, entrevistou 20.000 funcionários em todo o mundo, descobriu que o respeito era o comportamento de liderança mais importante. A sua pesquisa mostra que quando nos sentimos respeitados, somos mais felizes no trabalho e mais leais à nossa organização. Além disso, muitos de nós sentimo-nos ameaçados com as críticas. Na minha pesquisa, descobri que, quando recebemos feedback pior do que esperávamos, não apenas desconsideramos isso – também deixamos de querer estar com aqueles que o forneceram, o que pode prejudicar o desempenho no trabalho. Na verdade, a crítica produtiva é fundamental para ajudar as ideias de todos (e o desempenho) a melhorar.
Alguns meses atrás, participei numa reunião numa empresa de serviços, onde o objeto de discussão era uma decisão estratégica para a empresa. “E se abordássemos a questão de um ângulo diferente?”, perguntou um colaborador a meio da reunião. “Por exemplo, poderíamos perguntar ao nosso atual…” Ele não conseguiu terminar a frase pois o líder da reunião interrompeu-o dizendo: “Vamo-nos concentrar na abordagem estamos a discutir agora.”
Poof: num instante, a ideia do colaborador foi arrasada. Esta não é uma situação rara. A maioria de nós é muito rápida a julgar as ideias dos outros, e esse impulso é ainda maior quando estamos numa posição de poder. Então, as conversas geralmente acabam porque os líderes trazem as suas opiniões e rapidamente fecham as dos outros.
Em comédia de improviso, não há script a seguir: toda gente vai na onda. Mesmo quando não se está muito empolgado com a direção escolhida pela pessoa que interveio antes, aceita-se os termos da cena e depois acrescenta-se-lhe algo, em vez de a contradizer. Todos podemos confiar no mesmo princípio para nutrir e incentivar a sinceridade nos outros. Essa abordagem comunica mais curiosidade do que julgamento, abrindo novos caminhos para a discussão. É também uma maneira de mostrar respeito pelos outros e pelas suas contribuições.
DO it!: Refere que as pessoas que mostram uma aparência ou comportamento diferente da norma são percebidas pelos outros como tendo mais estatuto e poder do que as outras. Existem limites para o desvio do padrão, na atividade profissional de um vendedor?
FG: Deixe-me abordar essa questão de um ângulo diferente… E se você acabar com uma empresa de rebeldes, em que todos são rebeldes o tempo todo? Quando as pessoas me perguntam qual é a percentagem certa de rebeldes numa organização, eu simplesmente respondo 100%. Os talentos rebeldes que apresento no meu livro não são ameaçadores. Se usados com uma abordagem respeitosa, podem levar a mudanças positivas na organização e também na vida de alguém. Quando quebramos as regras confiando nesses talentos, sentimos um envolvimento total no trabalho que fazemos. É graças a esse compromisso que os rebeldes atuam em níveis mais altos nas suas funções, permanecem inovadores e alcançam o sucesso.
Existem rebeldes perigosos? pode ser o que me quer perguntar. Os rebeldes no limite podem perturbar demais as coisas? Eu dar-lhes-ia o benefício da dúvida e tentaria entender as intenções que dirigem o seu comportamento. Muitas vezes os rebeldes estão no limite, por causa da frustração. Aprenda com eles – eles podem ter algo inovador para oferecer.
DO it!: Nos Negócios devemos aumentar o espírito rebelde como forma de nos mantermos relevantes no mercado?
FG: Absolutamente! Os rebeldes são pessoas que se adaptam facilmente e que podem permanecer relevantes no mercado. Muitos líderes dizem que valorizam a rebeldia e a quebra de regras, mas não incentivam isso por medo de que isso resulte em caos. Conheci muitos líderes que, no final, pressionam pela conformidade por causa desse medo; mas também conheci líderes que modelaram a quebra de regras e a incentivaram nas suas organizações com bastante sucesso.
Uma das empresas que me vem à mente é a Intuit. Todos os anos, a empresa distribui prémios por grandes inovações que os colaboradores criaram. Mas há também um prémio para os melhores fracassos: tentativas que não deram certo, mas que permitiram que a empresa aprendesse alguma coisa. O prémio dos fracassos ainda vem com uma “festa falhada”. Isso cria um sistema em que as pessoas se sentem à vontade para quebrar regras, explorar e serem curiosas, pois sabem que não serão punidas por experiências que não se transformam em ideias inovadoras.
DO it!: Pode recomendar-nos 3 práticas diárias para aqueles que querem cultivar a rebeldia nas relações e nos negócios?
FG: Recomendo 3 coisas: quebrar, transformar, criar. Aprendi o poder dessas três palavras com o Chef italiano Massimo Bottura. Um dia, no seu restaurante com 3 estrelas Michelin, alguém deixou cair uma torta de limão, e Bottura transformou o acidente numa inspiração: uma sobremesa desconstruída, com um toque de creme, que parece estar em movimento. O nome: “Oops! Deixei cair a Torta de Limão”.
Os Rebeldes quebram rotinas. Fazem perguntas. Não têm medo de olhar para uma situação a partir de novas perspetivas. Não é preciso nascer-se rebelde. Só se tem que quebrar os maus hábitos que retêm as pessoas. Para descobrir os seus talentos rebeldes. Para se transformar. Para criar seu próprio sucesso: quebre, transforme, crie!